Amyr Klink em expedição: “Na faculdade, descobri o que eu não queria ser”, diz ele

Há 30 anos, Amyr Klink tornou-se o primeiro navegador a cruzar oceano Atlântico Sul sozinho, em um pequeno barco a remo, indo do porto de Lüderitz, na Namíbia, até Salvador (BA) – ninguém mais repetiu o feito desde então.

O trecho, de 7 mil quilômetros, foi percorrido em 101 dias, e a viagem deu origem ao bestseller Cem dias entre céu e mar, escrito pelo próprio navegador. “Nunca imaginei que iria remar o Atlântico. Acho que o que me conduziu para o que faço hoje foram os livros”, diz em bate-papo com o Na Prática.

Ele é formado em Economia pela Universidade de São Paulo e pós-graduado em Administração pela Universidade Presbiteriana Mackenzie. “Na faculdade, descobri o que eu não queria ser. Não queria ser um executivo, nem trabalhar na área financeira”, conta. “Sou tímido, atrapalhado, não sou um típico empreendedor, mas sempre gostei de fazer acontecer. Só entendi a importância de fazer um plano de negócios quando resolvi remar o Atlântico.”

Mesmo assim, é um grande defensor da execução. “O perfeccionismo às vezes é perigoso. Tenho amigos que estão há anos preparando um barco para fazer a volta ao mundo. Eles nunca vão fazer. Chega um momento em que você tem que parar de planejar. Tem que fazer acontecer, executar. Metade do que estava escrito no meu projeto não aconteceu. Ainda bem! E por que ele foi importante? Porque era uma referência. Mas não foi suficiente, não garantiria a viagem”, explica.

Amyr está envolvido em todas as etapas de suas expedições. É ele que planeja e constrói os barcos. “Uma coisa que me dá muito prazer é fazer as ideias se tornarem realidade”, afirma. Para ele, que realiza muitas viagens sem patrocínio, inovar é buscar resolver um problema a um custo coerente. Sem formação em engenharia, sempre dedicou grande parte de seu tempo estudando técnicas, formas, matemática e buscando quem pudesse ajudá-lo. “As viagens em si foram experiências muito menores do que o processo.”

Background

Para ele, uma das experiências mais importantes do período da faculdade foi o remo. “Descobri que entre 5h e 7h da manhã existia outro universo, com compromisso e objetivos claros. Para colocar um barco para remar no campeonato brasileiro, é preciso treinar no mínimo 1.500 horas. É mais do que 1 ano acordando às 4h da manhã e fazendo 2h30 por dia na água. Foi uma época em que eu não viajei, e eu muito gostava de viajar. Treinava sábado, domingo, Natal, aniversário da namorada, velório do pai, gripado, doente, com dor nas costas… Foi quando percebi que, se você quer fazer bem alguma coisa, tem que abraçá-la. Não tem perdão, não tem desculpa.”

Além dos livros, Amyr também se inspirou em velejadores franceses para entender melhor o mundo da navegação – um deles foi Éric Tabarly, com quem aprendeu a valorizar quem depende do mar para sobreviver. “Se o cara vive fazendo isso, ele sabe muito mais do que eu ou um professor. Comecei a dar um valor muito grande à simplificação extrema, a descobrir a essência das coisas. E quando você consegue perceber a essência de um mecanismo, você consegue a excelência, você consegue ser bom.”

Depois de cruzar o Atlântico, decidiu que era hora de conhecer o então pouco conhecido continente antártico. Participou de uma expedição brasileira em equipe até se sentir pronto para empreender a sua própria expedição, em solitário. Em 1989, passou um ciclo inteiro (de verão a verão) a bordo de um pequeno veleiro na Antártica. De lá seguiu para o Ártico, cruzando os dois círculos polares numa mesma viagem.

“O desapego é importante porque ele te conduz para uma coisa que tem um significado maior. No caso de empreender, é importante gostar muito do que você está fazendo. Quando você tenta pular etapas para conquistar um status que você vislumbra, vai passar por um processo que não é agradável. Você não vai se dedicar o tempo inteiro, não vai fazer acontecer”, diz. “O grande desafio do jovem hoje é se apegar a algo que realmente faça sentido para ele.”

Por Cecília Araújo / Fonte: Exame.com