Presidente do Walmart . com, Flávio Dias tem 36 anos e diz que sua principal  característica é  valorizar as pessoas que estão ao seu lado. Ele conta que aprecia quem é inconformista

Por Cláudio Marques

Com apenas 36 anos de idade, Flávio Dias já tem muita história para contar sobre sua carreira. Presidente do Walmart.com no Brasil, sua trajetória começa praticamente junto com o comércio eletrônico no País, em 1999, na Philips. Lá, ele entrou como estagiário e ajudou a criar e a implantar um projeto de sucesso na área de comércio virtual, fazendo parcerias com grandes redes de varejo. O bom resultado o ajudou a chamar a atenção da empresa e do mercado e lhe abriu as portas para “trocar de lado do balcão”, como diz, ao ir para o Magazine Luiza depois de sete anos na multinacional holandesa. Cerca de dois anos após ir dirigir o comércio online do Magazine, ele aceitou o desafio de criar do zero o setor de comércio virtual brasileiro do Walmart, onde, neste domingo, 23 de março, completou sete anos de casa. Formado em engenharia de produção, tem mestrado em administração pela Fundação Getúlio Vargas e Anderson School (da Universidade da Califórnia) e pós em e-commerce, ele conta que sempre gostou de trabalhar com números e lógica, mas escolheu marketing para começar a trabalhar. Eterno insatisfeito, diz que sua principal característica é genuinamente se preocupar com as pessoas que estão ao seu lado e confessa detestar arrogância. A seguir, trechos do depoimento.

Os exemplos – “Eu sempre me interessei em ler casos de pessoas que construíram empresas a partir de um sonho, pessoas que sempre ouviram que não seria possível, que não daria certo. E eu decidi que iria para uma empresa onde pudesse exercer, de alguma forma, a minha veia empreendedora. Sabia que precisava de um lugar que me permitisse fazer isso. E acabei indo parar na Philips num programa de estágio.”

O contato com e-commerce – “Ali, no estágio na Philips, começou a proximidade com esse mundo que eu respiro até hoje, porque eu entrei numa área do marketing que tratava de canais especiais. E isso num momento em que nascia um tal de comércio eletrônico, em 1999. E quando esse negócio começou a bater dentro da Philips, houve a indagação a respeito de quem iria cuidar disso. Decidiram jogar para a área de canais especiais, e eu automaticamente me prontifiquei a ser a pessoa que iria pegar esse negócio para entender e encaminhar a empresa nessa linha.”

Projeto vitorioso – “Depois de criado o negócio, mês após mês o canal ia mostrando que tinha muito potencial, o crescimento das vendas era exponencial. E aí a minha veia empreendedora me ajudou a conseguir conquistar um espaço muito grande, de criar coisas diferentes para alavancar o negócio dentro desse mundo virtual que estava nascendo.”

Parcerias – “Na Philips, eu tinha liberdade muito grande para sentar à mesa com o cara da Americanas, ou com o do Magazine Luiza, entre outros, e desenhar projetos diferentes. Colaborávamos na construção de um conteúdo diferenciado, de uma promoção que ninguém fazia, de serviços que até então não existiam e fomos evoluindo nessas propostas. Isso ganhou corpo, foi dando certo, até o ponto em que estruturamos um projeto lá dentro e o resultado foi que a Philips se tornou, por muitos anos, o principal fornecedor de todos os grandes e-commerce.”

Experiência no exterior – “Na Philips, mundialmente, o negócio começou a tomar força, e houve um projeto global em que precisaram de alguém da América Latina para ir para a Holanda, morar lá, e ajudar na construção de uma plataforma mundial da empresa. E eu fui, fiquei um tempo, voltei, continuei a fazer o trabalho já com âmbito de América Latina.”

Visibilidade – “Nessa época, (da volta da Holanda),  o negócio já estava bem mais representativo, já era um negócio de algum volume, e esse projeto que fizemos me deu uma visibilidade muito grande, dentro da empresa, pelos resultados que trouxe. Lá na Philips há competições de projetos. Participamos de uma disputa internacional, de fábricas e escritórios, e ganhamos como melhor projeto do mundo. Apresentamos todos os cases, resultados, e ganhamos. Foi muito interessante. Isso foi me ajudando a crescer na empresa e eles me colocaram num grupo muito seleto de talentos da empresa em nível global.”

Rede de relacionamentos – “Cuidando de toda a presença da Philips na América Latina na internet, do México para baixo, comecei a participar de algumas instituições relacionadas ao seguimento aqui no Brasil, participava dos comitês, dos eventos, contando sobre os projetos que tínhamos feito, contando outras coisas que estavam acontecendo na Philips fora do Brasil, e compartilhando experiências. Assim, comecei a formar uma rede de contatos muito grande e comecei a receber alguns convites para mudar do lado do balcão.”

Ida para o Walmart – “Depois de quase dois anos no Magazine Luiza eu recebi o convite do Walmart para criar o negócio a partir do zero. Pareceu-me uma oportunidade irrecusável, pois além do lado pessoal, eu trabalhava em Franca (então sede do Magazine Luiza) e já morava em Alphaville, onde é a sede do Walmart. com, ia ficar à frente de um ramo da maior empresa do mundo, com carta branca para fazer um projeto audacioso de construção de comércio eletrônico e podendo exercer minha vocação de empreendedor. “

Presidência – “Há cerca de dois anos ganhamos status de empresa, da qual sou presidente. Daquela salinha onde começamos o projeto com 20 pessoas, temos hoje mil pessoas que trabalham para a gente o tempo todo com a grande ambição de fazer um e-commerce cada dia melhor e de construir uma empresa que vai ser líder de mercado.”

Principal característica – “Acho que a principal característica que trago comigo é que eu genuinamente me importo com as pessoas que estão ao meu redor, eu me importo muito em fazer o melhor para elas, e tirar o melhor delas para que elas possam crescer, e eu crescer junto com elas. E obviamente saber como extrair o melhor que essa pessoa pode dar para o objetivo comum que se tem na empresa.”

Arrogância – “Eu tenho intolerância a poucas coisas, mas sou bastante intolerante com a arrogância. As pessoas que, por qualquer motivo que seja, acham que têm o direito de se julgarem superior às outras e usam isso de diversas formas para subir na carreira, ou tomando glória de coisas que não fizeram, ou pisando nos outros para crescer e arrumar atalhos na carreira, essa é uma coisa que eu nunca suportei. (…) Quando há um sucesso, ele é de todos, não existe a estrela que brilha sozinha. E quando há um problema, ele não é de uma pessoa, é de todos nós e vamos estar juntos para resolver.”

Dicas para iniciantes – “Em primeiro lugar, acho que tem de fazer algo que goste. Não adianta escolher uma carreira que pode dar muito dinheiro e a pessoa não se sentir bem fazendo. A segunda questão é que precisa se conhecer muito bem. Com o autoconhecimento você descobre quais competências o tornam uma pessoa única. E quando descobrir o que o torna único e o que você gosta de fazer, precisa combinar as coisas para escolher a carreira. Outra dica é ter consciência de que você não chega a lugar nenhum sozinho. Quanto mais você for subindo na carreira, mais vai depender das pessoas e menos de coisas que você faz sozinho. No começo da carreira é normal conseguir fazer as coisas só por mérito próprio. Mas quanto mais você vai subindo menos você vai fazer isso e mais você vai depender de conseguir influenciar as pessoas a fazer algo. Você tem de ter essa habilidade de influência e essa habilidade passa por ter competência de comunicação muito grande, poder de persuasão muito grande. É muito importante desenvolver isso, mas tem de ser feito de uma forma genuína, autêntica, se importando com as pessoas. E, claro, ter resiliência, persistência e ser eternamente um inconformado.”

Inconformismo – “O inconformismo é talvez uma das características mais marcantes que eu valorizo em um executivo e que eu cultivo para mim mesmo. Sinta orgulho com o trabalho feito, comemore o sucesso e as vitórias, mas sempre esteja inconformado com o que tem hoje, porque sempre podemos fazer muito melhor. Não existe nada que seja nota 10, porque uma vez que você dê nota 10 para uma coisa, você está dizendo que não dá mais para melhorar. Sempre dá para fazer melhor. Acho que é assim que as pessoas crescem, se desenvolvem, e acho que foram essas crenças que me fizeram ter o que eu possuo hoje na minha carreira.”

Fonte: Estadão