Por que as grandes empresas já não seduzem os jovens como antes? E quais as consequências disto para os líderes corporativos?

Diego Martins, aos 22 anos, trabalhava como consultor em uma grande empresa brasileira. Mas desde cedo foi muito inquieto. “Sempre quis fazer algo diferente. Sonhava com uma empresa em que as pessoas fossem elas mesmas e a felicidade, um objetivo comum a ser atingido”, dizia. Soa um tanto utópica essa história de conciliar felicidade com trabalho duro, metas rígidas e a busca incessante por rentabilidade – sobretudo num ambiente macroeconômico desfavorável. Para essa nova geração, contudo, a mistura desses quatro ingredientes representa não somente um objetivo profissional factível, mas uma filosofia de vida a ser defendida e perseguida diariamente. Com isso em mente, Diego largou a consultoria e se juntou a Ruy Jordão para montar a Acesso Digital, empresa que oferece tecnologia na gestão de processos e documentos. Desde 2011, a Acesso cresce mais de 70% ao ano. E foi considerada pelo segundo ano consecutivo a melhor empresa brasileira para se trabalhar, segundo o Great Place to Work.

Diego não é um caso isolado. Pesquisas demonstram que a maioria dos jovens que finaliza seu MBA em uma escola de prestígio prefere tentar o negócio próprio ou se juntar a uma promissora startup, em vez de buscar uma posição numa megaempresa já estabelecida. É um cenário bem diferente de 30 anos atrás, quando me formei. Lembro perfeitamente. Meu sonho, como o da maioria dos jovens daquela época, era entrar em um programa de trainee de um grande banco ou de uma multinacional de produtos de consumo. O que fez essa mudança acontecer? E quais as implicações para quem lidera essa nova geração?

Acredito serem vários os motivos da transformação, mas vou me ater a quatro reflexões, que considero fundamentais para quem quer aprender a lidar com essa turma:

1) Felicidade também tem a ver com “subir rápido”. Antes, para chegar a diretor, o camarada (se demonstrasse algum talento) teria de esperar uns 10 a 15 anos até assumir o posto. É tempo demais para os jovens de hoje. Por isso, a preferência pelas empresas menores, cuja ascensão pode ser mais rápida.

2) Eles querem impactar na estratégia. Essa história de ser trainee de um departamento e só se dedicar àquela determinada área deixa o jovem talento desestimulado. Ele quer saber para onde a empresa está indo e qual o seu papel nessa trajetória. Mais do que participar de inúmeros programas de treinamento, o jovem de hoje acredita no aprendizado prático, a velha história da mão na massa. Para ele, empreender dentro da empresa ou do próprio negócio é o melhor caminho.

3) Hierarquia mais informal ajuda um bocado. Menos burocracia, também. No início de minha carreira, a gente só encontrava o presidente da empresa no elevador, isso quando um assessor não pedia para sairmos para que o chefão chegasse mais rápido na cobertura. Jovens talentos querem ouvir, saber e até debater com o presidente os rumos do negócio e da sua área. E cobram decisões mais rápidas, sem dezenas de apresentações ou comitês para aprovar esta ou aquela medida.

4) Felicidade, para eles, é… valorização. Dê o crédito que o jovem talento merece e você terá um defensor da causa da empresa. Se o ambiente é legal e ele está deixando a sua marca na empresa, não terá motivos para deixar a companhia. Aquela história de infidelidade corporativa da nova geração só ocorre com empresas que não sabem valorizar esse “ativo”. O sentimento de pertencer é, para eles, mais importante do que carregar um cartão de visitas com o logo de uma grande empresa.

Muitos líderes mais seniores podem até achar que a nova geração está fora da realidade. Será mesmo? O avanço da tecnologia permitiu que, de um dia para o outro, surgisse uma série de empresas novatas quebrando barreiras e ameaçando a hegemonia de grandes companhias. Pense em Stubhub, booking.com, Drive Now, 99 táxis, Spotify… Esse momento disruptivo é capitaneado justamente pela geração “fora da realidade”. Entender como utilizar esse potencial criativo, empreendedor e provocador passou a ser, portanto, fundamental para qualquer um que queria manter sua empresa em condições de competir. Algumas grandes companhias já estão se mexendo para usufruir deste talento sem, necessariamente, ter de reformular todo o seu quadro de funcionários ou os seus processos. É o caso da rede britânica de lojas de departamentos John Lewis, fundada há mais de 150 anos. Em 2014, a John Lewis lançou a JLab, aceleradora que convida 10 startups para trabalhar durante o ano em suas instalações, com amplo acesso ao seu time executivo e com objetivo de melhorar produtos e serviços no varejo. Neste processo, a própria John Lewis pode se tornar o primeiro grande cliente dessas empresas inovadoras.

Trabalhar com talentos nunca foi fácil, em tempo algum. Com essa nova geração, ávida por mudar o mundo, o desafio é ainda maior. Mas acredito que – como quase tudo o que ocorre na vida – o melhor caminho é o do meio. Não devemos nem supervalorizar os jovens, assumindo o risco de se descolarem completamente da realidade, nem criticá-los por terem posturas que não foram as nossas, sob a ameaça de perdermos seu talento, energia e ambição pela inovação disruptiva. Um bom time sempre mistura o ímpeto e a experiência. A minha geração e a de Diego Martins podem trabalhar em harmonia. A criatividade está em buscar o melhor de cada uma.

Por Sergio Chaia* / Fonte: Época

  • Sergio Chaia foi presidente da Nextel , Sodexho Pass e vice-presidente para a América Latina da Symantec. Participa de diversos conselhos e atualmente é chairman da Óticas Carol. Também é palestrante e autor do livro “Será que é possível?”